A forma como as pessoas aprendem e se desenvolvem dentro das organizações está sendo redesenhada pela Inteligência Artificial. Durante anos, o modelo tradicional de treinamentos foi linear, baseado em cursos extensos e padronizados. Hoje, o aprendizado se torna dinâmico, adaptativo e personalizado. A IA não apenas entrega conteúdo, mas aprende sobre quem aprende, ajustando o ritmo, a linguagem e o formato de acordo com o perfil de cada profissional.
Um dos exemplos mais emblemáticos dessa transformação vem da Tigo, operadora do grupo Millicom. Em Ruanda, a empresa lançou o programa Mobile Internet Skills Training Toolkit (MISTT), com microaulas acessadas diretamente pelo celular. As chamadas “pílulas de aprendizado” ensinavam desde o uso do WhatsApp até noções básicas de segurança digital. O resultado foi impressionante: 77% dos participantes aumentaram o uso de dados móveis e a receita média por cliente cresceu 15%. A Tigo demonstrou que o aprendizado pode ser um motor de mudança de comportamento e de resultado de negócio.
O caso Tigo antecipa o que a IA está potencializando agora em larga escala. As trilhas de aprendizagem corporativas deixaram de ser lineares para se tornarem ecossistemas vivos. Plataformas com IA generativa já conseguem montar percursos personalizados para cada colaborador, combinando cursos, podcasts, simulações e mentorias. O sistema entende lacunas, propõe desafios e ajusta conteúdos de acordo com o ritmo e o estilo de aprendizado.
Essa personalização tem base científica. O modelo 70:20:10, amplamente validado em estudos da Center for Creative Leadership, mostra que 70% do aprendizado ocorre na prática, 20% nas interações sociais e apenas 10% em treinamentos formais. A IA está ampliando os 70% e 20%, registrando o que acontece no trabalho e transformando isso em aprendizado aplicável. Mas o valor do 10% formal continua central: é ali que a aprendizagem se estrutura, se conecta a propósitos e ganha profundidade.
A geração de conteúdo também mudou. Antes, criar um curso exigia semanas de produção. Hoje, modelos generativos podem criar textos, roteiros, quizzes e infográficos em minutos, sob a curadoria de especialistas. Isso democratiza a produção de conhecimento, permitindo que empresas atualizem seus programas com velocidade e relevância. O papel do instrutor passa a ser o de curador e designer de experiências, garantindo coerência, propósito e senso crítico.
Essa transformação, no entanto, é tanto cultural quanto tecnológica. As pessoas estão acostumadas a aprender em microformatos, em qualquer lugar e momento. É por isso que os podcasts se tornaram aliados estratégicos do aprendizado contínuo. Eu mesmo passei a criar meus próprios podcasts como extensão dos programas de formação, usando o formato para conectar o aprendizado formal às situações reais do cotidiano. O áudio tem uma força única para criar vínculo, manter o engajamento e reforçar o conteúdo de forma natural e recorrente.
Mesmo com todos os avanços digitais, a presencialidade segue sendo um pilar insubstituível. O encontro físico é o espaço onde o conhecimento se torna experiência, onde ocorre a troca entre pares e o senso de pertencimento. Em programas de liderança, inovação ou excelência operacional, os momentos presenciais são aqueles em que o conteúdo ganha corpo e emoção. O futuro dos treinamentos não é digital ou presencial, é híbrido e convergente. E a presencialidade precisa ter alto impacto, ser planejada e relevante à aplicação do conhecimento e gestão da mudança.
O instrutor do futuro será um facilitador de ecossistemas. Ele precisará combinar storytelling, dados e tecnologia para transformar informação em significado. O sucesso de um programa de capacitação deixará de ser medido apenas por horas de curso concluídas e passará a ser avaliado pelo impacto comportamental e pelos resultados gerados. A IA será uma aliada nesse processo, fornecendo diagnósticos, métricas de absorção e recomendações personalizadas.
Empresas que já entenderam esse movimento estão reconfigurando seus centros de desenvolvimento. Elas criam ambientes de aprendizagem inteligentes, onde a IA sugere conteúdos, conecta pessoas com mentores e monitora o progresso em tempo real. O aprendizado se torna parte da rotina, e não um evento isolado. Essa integração entre tecnologia e cultura de desenvolvimento é o que diferencia organizações que aprendem das que apenas treinam.
O futuro da aprendizagem corporativa é humano e tecnológico. Casos como o da Tigo mostram que inovação em aprendizado não depende de sofisticação, mas de propósito. Quando a tecnologia é usada para aproximar pessoas, personalizar experiências e gerar impacto real, o aprendizado se torna um ativo estratégico. A Inteligência Artificial está nos ajudando a ensinar melhor, mas é a presença, o diálogo e a emoção que continuarão tornando o aprendizado verdadeiramente transformador.