O imperativo de evoluirmos nos Programas de Trainees e Formação de Líderes para uma Geração que não quer Liderar.
Os dados revelam um ponto de inflexão no modelo de desenvolvimento corporativo. Segundo a Korn Ferry, 67% dos analistas de mercado acreditam que os líderes atuais não estão preparados para o futuro. Um estudo da CoderPad mostrou que 36% dos profissionais não têm interesse em cargos gerenciais, e apenas 2% da geração Z demonstram vontade de subir na hierarquia corporativa, conforme pesquisa conduzida por Gorick Ng, consultor de carreira de Harvard.
Esses números traduzem uma crise silenciosa: as empresas estão perdendo o desejo e o pipeline de liderança.
Durante décadas, o sucesso profissional foi medido pela quantidade de pessoas sob sua gestão. Liderar era sinônimo de status e recompensa. Hoje, o significado de sucesso se deslocou. Jovens profissionais priorizam equilíbrio de vida, autonomia e propósito. A liderança tradicional, marcada por sobrecarga, conflitos e baixa inspiração, perdeu apelo.
Sem referências positivas e diante de líderes exaustos, os novos talentos questionam se vale a pena trocar tempo e saúde por status e remuneração.
Nesse contexto, a retomada dos programas de trainees e dos Programas de Desenvolvimento de Lideranças (PDL) ganha urgência. Por muito tempo, essas iniciativas foram estruturadas para formar gestores hierárquicos, obedecendo a trilhas rígidas e lineares. Agora, precisam ser redesenhadas com foco na formação de líderes adaptativos, colaborativos e capazes de integrar tecnologia, pessoas e propósito.
O novo programa de trainees não é mais um atalho para o topo, mas um laboratório de aprendizagem para desenvolver habilidades de influência, pensamento crítico, empatia e gestão de complexidade. Já os PDL devem atuar como espaços de amadurecimento emocional e estratégico, ajudando líderes em diferentes níveis a compreender seu papel em contextos de transformação digital, diversidade e inovação.
Os riscos de não investir nesses programas são claros. Sem sucessores preparados, as empresas enfrentam um vácuo gerencial. As decisões tornam-se reativas, as equipes perdem coesão e a cultura organizacional enfraquece. A ausência de líderes inspiradores também aumenta o turnover e reduz a capacidade de reter talentos de alto potencial.
Trainees e PDLs modernos devem adotar uma arquitetura híbrida de aprendizagem, combinando experiências presenciais, mentoria, feedback contínuo, desafios reais e o uso de IA para personalizar o desenvolvimento. É preciso equilibrar técnica e humanismo, ensinando não apenas a gerir processos, mas a liderar pessoas e sistemas em constante mudança.
A liderança contemporânea não é sobre poder, mas sobre coerência. As empresas que conseguirem formar líderes capazes de inspirar confiança, promover engajamento e articular propósito com resultado terão uma vantagem competitiva decisiva.
Reinventar os programas de trainees e PDLs não é uma opção. É um imperativo estratégico para reconstruir a atratividade da liderança e garantir que a próxima geração esteja preparada para guiar organizações inteligentes, éticas e humanas em um mundo cada vez mais incerto.
A transição que vivemos pede que deixemos de pensar em pipeline e passemos a construir ecossistemas de liderança. Em vez de formar líderes em sequência, precisamos cultivar ambientes que formam líderes em rede, onde o aprendizado é coletivo, o erro é fonte de insight e o crescimento é compartilhado.
Os programas de trainee têm papel essencial nesse novo desenho. Eles podem, e devem, funcionar como porta de entrada para o desenvolvimento de competências de liderança, não apenas como um “fast track” para cargos gerenciais. Quando bem estruturados, tornam-se laboratórios de experimentação, nos quais os jovens talentos aprendem a influenciar sem autoridade, comunicar com empatia e gerar resultados através da colaboração.
Conectados aos Programas de Desenvolvimento de Lideranças (PDL), os trainees passam a trilhar uma jornada contínua:
– Trainee: aprende a liderar a si mesmo.
– Líder em formação: aprende a liderar outros.
– Líder de referência: aprende a liderar o sistema.
Esse encadeamento transforma o desenvolvimento em algo vivo, dinâmico e sustentável. Ele reduz o vácuo de sucessão, fortalece a cultura organizacional e resgata o significado da liderança como um ato de serviço e propósito, e não de status.
Nenhuma transformação acontece apenas “de baixo para cima”. A mudança na forma de formar líderes também precisa ser compreendida e aceita pela liderança atual. Não se trata de exigir que os gestores de hoje adotem, de imediato, todas as novas práticas, mas de reconhecer a necessidade do novo e permitir que ele floresça.
Os programas de trainee e os novos PDLs só ganharão força se encontrarem terreno fértil e esse terreno é feito de abertura, escuta e humildade das lideranças estabelecidas. Discutir o conteúdo do PDL dos trainees é um excelente ponto de partida: um diálogo intergeracional que traz à tona diferentes visões sobre o que é liderar.
Será um ponto de conflito saudável, onde experiências e expectativas se encontram. E é justamente nesse atrito, entre o que já foi e o que precisa ser, que nasce o aprendizado coletivo e a verdadeira evolução das culturas de liderança.
Mais do que recrutar talentos, as empresas precisam cuidar de quem vai cuidar dos outros. Investir em programas de trainee e PDL integrados é criar um ciclo virtuoso de aprendizado que começa no início da carreira e se estende até o topo, um ciclo em que cada geração prepara a próxima.
No fim das contas, a pergunta que cada organização precisa se fazer é simples, mas poderosa:
“Estamos formando pessoas para cargos… ou preparando pessoas para causas?”
A resposta a essa pergunta definirá quais empresas terão líderes prontos para o futuro, e quais ficarão presas ao passado.