O uso de Inteligência Artificial (IA) na saúde está redefinindo diagnósticos, fluxos clínicos e a experiência do paciente. Um hospital chinês de ponta e um hospital público brasileiro do SUS ilustram como a mesma tecnologia pode gerar resultados distintos conforme o contexto econômico, cultural e de gestão.
Na China, o Peking Union Medical College Hospital (PUMCH) implementou um sistema baseado em deep learning para leitura de exames de imagem e triagem automática de pacientes. O algoritmo, treinado com mais de 10 milhões de exames, atingiu acurácia de 96% em diagnóstico de pneumonia e nódulos pulmonares. Essa integração reduziu em 40% o tempo médio de atendimento e permitiu que médicos dedicassem mais tempo à análise clínica. A adoção foi viabilizada por forte investimento estatal em infraestrutura digital e pela integração com prontuários eletrônicos unificados.
No Brasil, o Hospital das Clínicas de São Paulo vem aplicando IA em iniciativas dentro do SUS, especialmente em triagem de exames laboratoriais e apoio à decisão clínica. Um sistema de IA treinado com dados anonimizados consegue identificar riscos de sepse e insuficiência respiratória antes da manifestação clínica, permitindo intervenções precoces. Apesar dos recursos mais limitados, o hospital conseguiu reduzir em 15% a mortalidade por sepse nas UTIs participantes do programa, segundo dados do próprio HC-USP.
A diferença entre os dois casos não está na tecnologia, mas na governança. Enquanto o hospital chinês opera em um ecossistema centralizado, com interoperabilidade total dos dados e incentivos governamentais, o hospital público brasileiro precisa lidar com sistemas fragmentados, infraestrutura desigual e falta de padronização entre estados. Ainda assim, o SUS mostra que inovação é possível mesmo em ambientes de restrição, desde que a IA seja aplicada com foco clínico e não meramente tecnológico.
Outro ponto relevante é a formação profissional. Na China, médicos e engenheiros clínicos são treinados em cursos conjuntos de medicina computacional, o que acelera a incorporação de IA ao cotidiano hospitalar. No Brasil, o HC iniciou um programa piloto de letramento digital para residentes e enfermeiros, com resultados promissores em eficiência administrativa e qualidade de registro.
Os dois exemplos convergem em um ponto: a IA amplifica a capacidade humana, mas não substitui o julgamento clínico. Quando bem aplicada, a IA no hospital público democratiza o acesso à medicina de precisão; no hospital de ponta, potencializa o desempenho e reduz custos operacionais. Ambos os caminhos apontam para um mesmo destino: um sistema de saúde mais inteligente, preditivo e centrado no paciente.
O desafio, portanto, não é técnico, mas estratégico. Implementar IA em saúde exige governança de dados, ética algorítmica e capacitação contínua. A China mostra a velocidade que o investimento pode trazer; o SUS, a resiliência e o impacto social que a IA pode gerar. Juntos, mostram que o futuro da medicina será tão inteligente quanto for humano.