A Ford, uma das gigantes do setor automotivo que já dominou cerca de 22% do mercado brasileiro, tomou uma decisão ousada em 2021 ao encerrar suas operações fabris no Brasil e adotar uma nova estratégia para o mercado local. Agora, com foco em modelos importados, a empresa reposicionou sua marca em um segmento mais premium, adaptando-se às novas tendências e expectativas do setor automotivo.
O contexto que levou a essa medida foi moldado por anos de prejuízos bilionários acumulados entre 2011 e 2021, somando R$ 39,5 bilhões. A operação local enfrentava dificuldades crônicas relacionadas aos altos custos trabalhistas, barreiras regulatórias e a volatilidade cambial, o que manteve a empresa no vermelho, mesmo com incentivos fiscais. Em 2020, por exemplo, a Ford chegou a vender 140 mil veículos, mas amargou um prejuízo de mais de R$ 10 mil por unidade vendida, evidenciando um modelo de negócios que se tornava cada vez mais insustentável.
Diante desse cenário desafiador, a decisão de encerrar a produção local e focar na importação de veículos de maior valor agregado foi uma tentativa de reverter a situação financeira. E a estratégia mostrou-se acertada. Com o foco voltado para modelos como Mustang, Ford Pro, F-150, Ranger e Territory, a empresa conseguiu elevar o ticket médio de seus veículos no Brasil, que saltou de R$ 105 mil para R$ 272 mil. A mudança não apenas melhorou a percepção de marca, posicionando-a em um segmento mais premium, como também aumentou significativamente a rentabilidade. Hoje, a Ford registra um lucro médio de R$ 28 mil por veículo na América do Sul, consolidando-se como a operação mais lucrativa da região mesmo com uma redução do share. No Brasil, por exemplo o o share saiu de 8,2 para 1% no período.
A transformação estratégica da Ford levanta debates sobre os rumos da indústria automotiva no Brasil e na América Latina, expondo os desafios de manter operações industriais em um ambiente econômico instável e altamente competitivo. Enquanto a decisão resultou em críticas e protestos, sobretudo dos trabalhadores impactados, a empresa parece ter encontrado um novo fôlego no mercado regional, apostando em tecnologia, inovação e na importação de modelos icônicos que dialogam com um público de maior poder aquisitivo.
Para muitos especialistas, o fechamento das fábricas no Brasil marca o fim de uma era, mas também simboliza o início de um novo ciclo, em que a Ford busca maximizar seus lucros e reposicionar sua marca em um contexto de mudanças tecnológicas e de comportamento de consumo no setor automotivo. O caso da Ford exemplifica como uma reestruturação pode transformar prejuízos em lucros quando alinhada a uma estratégia clara e direcionada ao mercado, ainda que às custas de mudanças significativas para os seus empregados e a economia local.