Nos últimos anos, empresas de todos os tamanhos correram para digitalizar seus programas de treinamento. Criaram universidades corporativas, compraram plataformas LMS, produziram centenas de vídeos e transformaram sua estratégia de T&D em um repositório de cursos EAD.
Missão cumprida? Não.
Na verdade, essa corrida pode estar sabotando o desempenho e a competitividade da sua organização.
A ilusão da escala
É compreensível: o EAD é escalável, barato, fácil de entregar e reportar. Mas eficiência sem efetividade é desperdício de recursos.
Segundo dados da plataforma Coursera, apenas 5% a 10% dos alunos concluem cursos online abertos (MOOCs). Em plataformas corporativas, a taxa de evasão de cursos assíncronos pode ultrapassar 80%, como mostram estudos da Brandon Hall Group.
Um estudo da Association for Talent Development (ATD) mostrou que menos de 35% das empresas mensuram se o aprendizado foi efetivamente aplicado no trabalho. E quando medem, os resultados mostram uma dura realidade: vídeos e quizzes não mudam comportamento.
A armadilha do orçamento base zero
Com a digitalização dos programas de capacitação, muitas empresas adotaram orçamentos “base zero” para T&D, ou seja, partem do princípio que nada será investido se não houver justificativa clara. O que na prática virou um eufemismo para corte sistemático de iniciativas estratégicas.
Ao se apoiar apenas no EAD como solução de baixo custo, as áreas de RH e Desenvolvimento deixaram de investir em experiências de aprendizagem de alto impacto, como projetos reais, mentorias, coaching, labs, shadowing e simulações — estratégias que geram retenção, transformação e ROI real.
Aprendizado sem contexto é só conteúdo
Aprender exige contexto, desafio, feedback, prática e reflexão. O neurocientista John Medina, autor de Brain Rules, reforça: “A informação sem emoção, sem prática e sem aplicação, não se fixa no cérebro”.
E é justamente isso que o ensino orientado a projetos traz: um ambiente vivo, com problemas reais, trabalho em equipe, prazos, aprendizados iterativos e entrega de valor.
Estudos do MIT e da Universidade de Stanford demonstram que o aprendizado baseado em projeto (PBL) melhora em até 70% a retenção do conteúdo e em 85% a percepção de relevância do aprendizado para o trabalho.
E o que fazer, então?
A resposta não é abandonar o EAD. É deixá-lo no lugar certo: como suporte, complemento, não como única via.
1. Adote um modelo híbrido, intencional
Combine o EAD com momentos ao vivo, síncronos ou presenciais. Use o digital para preparar terreno, nivelar conhecimento, dar flexibilidade. Use o presencial para trabalhar soft skills, debater, cocriar e praticar.
2. Foque em aprendizagem orientada a projetos
Coloque o aprendizado em movimento. Traga desafios reais, problemas da organização, entregas com impacto. Transforme cursos em experiências.
3. Meça o que importa: impacto, não presença
Deixe de medir só NPS e conclusão. Avalie mudanças de comportamento, indicadores de negócio, antes e depois. E faça uma pergunta simples e poderosa na avaliação:
“Se esse curso tivesse sido presencial ou ao vivo, você acredita que a experiência teria sido melhor?”
Essa pergunta expõe o gap de engajamento de muitos cursos assíncronos. E serve como termômetro para ajustar a jornada de aprendizagem.
4. Revalorize o investimento em experiências transformadoras
Sim, treinamentos ao vivo custam mais. Mas também geram mais resultados, retenção, engajamento e aprendizado real. Demonstre esse ROI com dados, cases e indicadores. Se o problema é justificar o custo, talvez o real desafio seja demonstrar valor, não reduzir o orçamento.
Em tempos de inteligência artificial, o diferencial das empresas continuará sendo humano. E humanos aprendem melhor com interação, prática e propósito.